Num quarto só com quatro peregrinos, não dei pelo burburinho da manhã, pelo que acordei tarde, às 6:40. Saí do albergue já perto das 8:00. Entrei na Eremita Ecce-Homo. Estes locais são sempre uma ratoeira para donativos. Têm uma mesa onde se encontra uma pessoa que carimba as credenciais com o carimbo daquele local. Deixei algumas moedas, como deixava sempre. Felizmente não estava muito apertado com o dinheiro, como via em muitos dos peregrinos mais jovens.
Ao caminhar pela manhã, um pensamento começou a tomar forma, e desse pensamento uma inquietação e logo depois a busca por uma resposta. É difícil de explicar como surgem essas coisas no Camino. Comecei a pensar que não poderia caminhar mais em medo. O medo de voltar a suceder o mesmo que em San Juan de Ortega e Sahagún. Descobri que no fundo, caminhava com esse medo, escondido, mas sempre presente. Pensei que era algo que não poderia controlar na altura, se me voltasse a suceder de novo, mas era algo que poderia controlar antes, para o evitar. Tão simples. Estava-me a suceder no Camino o mesmo da vida do dia a dia. Tinha que prevenir e não deixar escalar para aquilo que temia, sem nada fazer. Só tinha que aprender como. Mas no Camino, já o tinha aprendido. O sol nasceu. O renascer de um novo dia. O renascer de uma nova vida. Agora compreendia. O Camino tentava ensinar-me isso há dias. Ouvia o ruído, mas não ouvia o som, claro e distinto. Era agora tudo tão claro. Tinha feito tudo para estar naquele local, naquela situação. Não tinha nada a conter-me. Nada a prender-me. Ninguém. Nenhuma coisa que me obrigasse a viver aquele dia como o anterior. Podia viver uma nova vida em cada dia. Seria um novo dia, isolado dos anteriores. Sem preocupações. Algo tão difícil no dia a dia. E também tão difícil de o fazer quando o podemos. À medida que o sol nascia, sentia os seus raios a aquecerem-me a pele e o interior do corpo. Podia fazer imenso calor. Podia chover torrencialmente. Iria adaptar-me. Não me doía nenhuma parte do corpo. Sentia-me forte. Caminhava bem. Caminhei em frente sorrindo. Caminhava feliz.
Cheguei a Murias de Rechivaldo onde entrei no albergue. Bebi um café solo no pátio interior. O albergue pareceu-me ser impecável! Uma excelente escapatória para quem não gosta da agitação habitual das cidades, como Astorga. O hospitaleiro sempre muito simpático com todos os peregrinos que entrava.
Sem nenhuma excepção, todos os pueblos desde Murias de Rechivaldo até Molinaseca, fazem desejar passar lá o dia, ficando no albergue. Sem excepção! Ainda não sabia, mas estava a iniciar a travessia dos Montes de León, onde se revela um dos percursos mais belos de todo o Camino Francês, com paisagens e pueblos de cortar a respiração. Inicia-se também aqui novamente o percurso fora da estrada. Finalmente!
Sem nenhuma excepção, todos os pueblos desde Murias de Rechivaldo até Molinaseca, fazem desejar passar lá o dia, ficando no albergue. Sem excepção! Ainda não sabia, mas estava a iniciar a travessia dos Montes de León, onde se revela um dos percursos mais belos de todo o Camino Francês, com paisagens e pueblos de cortar a respiração. Inicia-se também aqui novamente o percurso fora da estrada. Finalmente!
É tradição colocar uma pedra em cima de cada marco do Camino. Cada pedra, um problema que fica para trás, ou simplesmente a presença da passagem de um peregrino. Mas este ganha o prémio paciência!
Cheguei rapidamente a Santa Catalina de Somoza. Parei no segundo café com esplanada do pueblo, tal como recomendado pelo pai do dono do café, que se encontrava na entrada do pueblo a vender bastões, conchas e outros objectos relacionados com o Camino.
O caminho para El ganso custou um pouco devido à falta de sombra das árvores. Toda a etapa do dia foi muito agradável. Novamente a paisagem mudava para grandes vales e montes verdes. A travessia do deserto de Castilla tinha terminado. Estava nos montes de León. Em El Ganso parei novamente num bar. Bebi uma coca-cola e descansei um pouco, apesar de não me sentir cansado. Queria apenas parar em cada pueblo e apreciá-lo um pouco.
A caminho do Rabanal, parei para comer debaixo de umas árvores. A poucos quilómetros de chegar, o Camino sobre um pouco, vendo-se o Rabanal del Camino lá no alto. A subida faz-se escalando um trilho de rochas e terra batida, por entre árvores cerradas. Finalmente, a entrada de Rabanal del Camino. Encantador!
No entanto, cometi um erro. Não olhei para o guia, para me informar de quais os albergues que existiam. Fiquei logo no primeiro, que é algo que nunca se deve fazer. Um albergue privado, ainda por cima. O dono convenceu-me a ficar dizendo que no municipal era só menos 1€ do que ali, e ali tinham melhores condições. Não foi pelo dinheiro. Foi mais pela comodidade. Depois, quando entrei nos restantes albergues, incluindo o municipal, verifiquei que eram espectaculares! Com enormes pátios e jardins. Não fiquei muito chateado, porque podíamos sempre estar nos restantes albergues, sem dormir lá, é claro.
No entanto, cometi um erro. Não olhei para o guia, para me informar de quais os albergues que existiam. Fiquei logo no primeiro, que é algo que nunca se deve fazer. Um albergue privado, ainda por cima. O dono convenceu-me a ficar dizendo que no municipal era só menos 1€ do que ali, e ali tinham melhores condições. Não foi pelo dinheiro. Foi mais pela comodidade. Depois, quando entrei nos restantes albergues, incluindo o municipal, verifiquei que eram espectaculares! Com enormes pátios e jardins. Não fiquei muito chateado, porque podíamos sempre estar nos restantes albergues, sem dormir lá, é claro.
Um deles tinha um bar ao longo do pátio, com mesas e cadeiras. Fui lá duas vezes durante a tarde. A primeira, para comer algo. Pedi "macarrones", um prato comum em toda a Espanha como primeiro prato de um almoço ou jantar, onde me deram uma travessa enorme que dava à vontade para umas três ou quatro pessoas! Por vezes as doses eram exageradas.
No mesmo albergue onde fiquei, vi pela primeira vez três jovens alemãs que viajavam em grupo. A Julia ("Rulia"), Marie e Angela ("Gaeli"). Não as conheci nesse dia. No entanto, iria conhecê-las individualmente e sem dar por isso, influenciar directamente o Camino delas. Conheci também a Ana, uma brasileira que viajava com a sua mãe. Estava admirado por ver tão poucos brasileiros no camino. Eram apenas os 7º e 8º brasileiros que conhecia no Camino. Tinha a noção de que haviam bastantes brasileiros no Camino, no entanto, eram dos menos numerosos.
Não sei o que se passou nessa noite, mas todos se deitaram ás 21:00. Eu já achava que deitar-me às 22:00 era cedo demais. Seria prática comum dos peregrinos que preferiam os albergues privados?! Ainda estive acordado até às 22:00, primeiro na rua, a conversar com um ou outro peregrino deambulando por lá, e depois já na cama, onde a Gaeli me perguntou se já podia apagar as luzes. Tinha que ser. No dia seguinte, tinha uma grande escalada pela manhã. Queria sair bem cedo.
1 comentário:
É encantador "viajar" contigo. Gostaria de ter visto mais fotos dos jardins dos outros albergues..
Um forte abraço.
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