sábado, 8 de março de 2008

Dia 32: Santiago de Compostela - Negreira

Apesar de ter um quarto todo só para mim, às 6:00 já estava acordado. Tomei o pequeno-almoço num café que já estava aberto na rua da pensão. Dos poucos clientes, os mais idosos bebiam os seus pequenos copos de uma qualquer bebida alcoólica como manda a regra, de penalty. Observava os hábitos tão diferentes dos meus à medida que bebia o meu café com leite. Em Portugal, num café, devo ter bebido no máximo uns dois cafés com leite, o vulgo "galão". Ali, no caminho, tornara-se um hábito diário. Era energia que necessitava. Às 7:00, ainda noite cerrada, estava na rua, pronto para sair de Santiago.

Santiago ao longe

Mesmo no fim da Rua das Hortas, ainda em Santiago, encontrei o Denis. Caminhámos juntos. Não apenas por um instante, mas durante três dias, até Finisterra, além do quilómetro zero.

Denis a sair de Santiago

Perdêmo-nos á saída de Santiago, depois de atravessar a ponte Sarela. Subimos um monte que não devíamos. No topo, encontrámos uma pequena localidade em que uma mulher idosa, já acordada e à janela da sua casa, nos avisou que o caminho era lá atrás, bem lá em baixo. Por uma coincidência incrível, nesse dia enganámo-nos no caminho por três vezes, e foi sempre uma mulher à janela de uma casa que nos avisava que aquele era o caminho errado.

Os sinais do caminho mais escondidos

O caminho de Finisterra é muito diferente do Francês. Estavamos mal habituados com os cafés à nossa espera em cada pueblo. Só encontrámos o primeiro café em Ventosa. Pausa para um bocadilho quente. O gato do café era psicótico! Nunca tinha visto nada assim. Tirámos umas dez fotos ao gato alucinado. Ele gostava de ser a estrela da maluqueira.

Psyco-Cat a tentar desfazer a minha mochila

O percurso mais difícil desta etapa foi a subida de quase 200 metros em apenas 1 km. Não sei porquê, talvez por o dia anterior ter sido um dia atípico, estava bastante cansado neste dia. Muito mesmo.

A caminho de Pontemaceira

A localidade de Pontemaceira é o ponto alto do percurso. É deslumbrante. Parámos para uma caña numa esplanada com vista para o rio e para a ponte de modo a admirar o local por um bocado.

Pontemaceira

Denis a atravessar a ponte

Um local muito belo

Pontemaceira

O meu guia não podia estar certo. Mostrava só 18 quilómetros até Negreira, mas de facto, penso que foram uns 24 quilómetros. Custa sempre muito mais quando somos enganados com as distâncias para menos daquilo que realmente são. O cúmulo foi uma placa que indicava "Albergue: 2km" que... bem, até gozei que deveriam ser quilómetros Galegos. So podia!

A caminho de Negreira

Camino

O albergue situa-se na outra extremidade oposta de Negreira, quase fora da cidade, no topo de um monte. Era um albergue pequeno, com poucas camas. No exterior, encontravam-se permanentemente montadas naquela altura do ano, três grandes tendas. Fomos dos primeiros a chegar, mas no final do dia, todas as camas estavam ocupadas, o chão das tendas lotado e a sala comum do albergue coberta de colchões. Ao contrário do que pensara, talvez por ter encontrado apenas três peregrinos em toda a etapa no Camino, estavam muitos a fazer o caminho de Finisterra. Muitos deles tinham começado o caminho em Santiago de Compostela, tendo já terminado um dos outros caminhos mais distantes em anos anteriores. Outros, estavam a fazer o caminho inverso, tendo partido de Finisterra ou de Muxia. Mas a maioria, vinha do caminho Francês.

Negreira

Fui almoçar com o Denis a um restaurante na cidade. O vinho era excelente. A comida também. Finalmente reabasteci-me num supermercado. Já há uma semana que não ia a um supermercado.

No albergue, durante a tarde, aos poucos iam chegando os peregrinos que nos iriam acompanhar nos próximos dias. Os dois Londrinos completamente alucinado, a Jasmine, a Coreana e o Alemão, o Miro. Finalmente conheci os primeiros Portugueses no caminho! O Carlos e a mulher, a Margarida. Tinham começado em Santiago e iam para Finisterra. Foi estranho ouvir Português no Caminho pela primeira vez em quase cinco semanas. Inicialmente tinha que pedir ao Carlos para repetir o que dissera porque o meu cérebro estava virado para o Espanhol, Inglês, Italiano, Alemão e todas as outras línguas que me habituara a ouvir no Camino.

O Carlos e a Margarida já tinham feito o caminho Inglês no passado, e divertiram-nos com algumas histórias peculiares da sua aventura num caminho muito duro e pouco frequentado. Conheci também o Bruno, um brasileiro que me iria acompanhar de volta a Santiago, e a Marlene, uma brasileira que nesse mesmo dia, fazia uns supreendentes 50 anos. Não parecia NADA! O Carlos e a Margarida foram comprar um pequeno bolo e velas e cantámos os parabéns no albergue. O seu companheiro de caminho, o Léo, também estava lá, chegando sempre mais tarde, devido a enormes dificuldades físicas.

O bolo de aniversário. Miro, Margarida, Marlene e o Londrino.

Para o jantar, o Denis fez uma "pasta" com tomate, cogumelos, cebola e abacate divinal. Dividimos uma garrafa de vinho. Deitei-me um pouco depois das 22:00. O Carlos deitou-se logo de seguida. Era a sua primeira noite num albergue. Após entrar no quarto e ouvir o primeiro roncador, digno desse título, não se conteve em soltar um "fouuuda-se!" (ler com sotaque do norte). Hehe. Português sem dúvida alguma. Iniciantes num caminho populado. Adormeci rapidamente. Estava exausto.

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